Selecção e Dosagem de Ingredientes
Na selecção da borracha ou borrachas a utilizar, materiais que constituem o Subsistema Matriz Elastomérica, devem ser verificadas as seguintes condições de serviço do artefacto:
Na Figura 5 apresentamos uma representação clássica do espectro dos vários tipos de borrachas, em função da classificação ASTM D2000 em tipos (temperatura de serviço) e classes (resistência ao óleo IRM N.º 3).
Figura 5 – Espectro Temperatura de Serviço versus Resistência ao Óleo IRM N.º3
Na Tabela 6 que apresentamos na página Concepção e Projecto de Artefactos de Borracha, Tipo de Borracha (ver aqui), podemos observar, de forma organizada, a sequência que nos conduz à borracha ou borrachas que satisfazem os requisitos básicos enunciados. Podem existir, naturalmente, outros tipos de requisitos, dos quais, a título de exemplo e pela sua importância, pode ser a necessária resistência do artefacto a uma determinada substância química com a qual vai estar em contacto. Este requisito pode obrigar a uma selecção de compromisso. Outros requisitos, como por exemplo, a tensão e alongamento na rotura, a deformação residual em compressão e a resistência ao desgaste podem intervir, de forma decisiva, nesta selecção e obrigar, igualmente, a uma selecção de compromisso. Recordamos também as três representações gráficas que ilustram a gama de variação de três propriedades: dureza, tensão de rotura e alongamento na rotura (ver aqui). Nas Tabelas mostradas na página atrás referida, apresentam-se, respectivamente:
Estas tabelas permitem, de certo modo, antecipar os níveis que é possível atingir nos valores destas propriedades. Estes limites devem, no entanto, ser entendidos como meramente orientativos. Existem, na literatura e em vários sítios da Internet, quadros ou tabelas com as propriedades dos diferentes tipos de borrachas e a sua resistência quando em presença de alguns tipos e famílias de substâncias químicas. São tabelas do tipo que apresentamos nos Quadros 4 e 5.
Abreviaturas usadas nos Quadros 4 e 5:
Na Tabela 4 apresentamos a resistência química dos vários tipos de borrachas, na presença de cerca 1390 substâncias, algumas delas em diferentes condições de concentração e de temperatura. De qualquer forma, para definir a borracha ou borrachas a utilizar temos de verificar, à partida – como inicialmente dissemos de forma resumida – qual o factor ou factores que são determinantes para a durabilidade do artefacto, e que podem ser:
Para muitos tipos de aplicações, a borracha ou borrachas a aplicar estão, à partida, praticamente definidos. Assim, vejamos alguns tipos de aplicações:
Depois de seleccionada a borracha ou borrachas a utilizar, a tarefa que se segue será a de seleccionar, entre os diversos tipos disponíveis no mercado das várias borrachas, aquele ou aqueles que melhor satisfarão os diversos requisitos – requisitos que dizem respeito ao processo produtivo que vai ser utilizado e requisitos que dizem respeito à especificação do cliente, ao bom desempenho e durabilidade do artefacto.
Vamos apresentar um exemplo que ilustra o que foi dito.
Para o fabrico de um determinado artefacto foi seleccionada borracha de acrilonitrilo butadieno (NBR); o teor de acrilonitrilo (%AcN) varia entre 15 e 51%. Ter em atenção, desde já, que o custo da borracha é tanto mais elevado quanto mais elevado for o teor de AcN. Para a aplicação em causa deve ser selecionado o teor de acrilonitrilo mais adequado, que possa satisfazer os requisitos de resistência ao óleo e à temperatura de serviço.
A temperatura de serviço pode ser determinante nesta selecção; borrachas de NBR com baixo teor em AcN permitem um melhor desempenho a baixas temperaturas.
Seleccionado o teor de AcN, deve ser seleccionada a borracha com a viscosidade mais adequada aos níveis de carga e de plastificante que vão ser utilizados para proporcionar o reforço necessário, de modo a obter os requeridos níveis de dureza, módulo, tensão e alongamento na rotura e que devem também proporcionar um processamento fácil em todo o ciclo produtivo.
Se o artefacto em serviço estiver em contacto com produtos alimentares, a borracha seleccionada deve satisfazer os requisitos relativos a este aspecto: por exemplo, cumprir os requisitos FDA (Food and Drug Administration, USA) ou requisitos da EU ou de países membro.
O que ficou dito neste exemplo aplica-se a todas as borrachas. Para cada borracha existem no mercado diversos tipos, decorrentes das variáveis de polimerização: a frio ou a quente, em emulsão ou em solução, tipo de distribuição de pesos moleculares, diferentes percentagens dos diferentes monómeros presentes nos copolímeros ou nos terpolímeros, tipos de sequências do monómeros, grau de ramificação das cadeias do polímero, manchantes ou não manchantes, estendidas em óleo ou não, tipo de óleo de extensão, com negro de carbono ou não, tipo e quantidade de negro de carbono, com diferentes níveis de insaturação, de halogenação, de hidrogenação, de carboxilação, etc. Estas variáveis podem ser vistas nas páginas descritivas dos vários tipos de borracha.
A realidade na regular actividade de um técnico de formulação é, por vezes bem diferente em termos de selecção de ingredientes de mistura. E o que vai ser dito aplica-se a todos os ingredientes. É que muitas vezes o técnico está limitado a utilizar apenas certos tipos de matérias-primas que estão regularmente disponíveis no seu país e, num âmbito ainda mais restrito, na sua região. Uma matéria-prima com maior interesse técnico pode apenas estar disponível para uma importação directa e em quantidades que não se ajustam às reais necessidades do fabrico em causa. São contrariedades perfeitamente possíveis, que obrigam à adopção de determinados compromissos.
Em Portugal, durante muitos anos estiveram estabelecidos, com escritórios e armazéns, os nomes mais relevantes de fabricantes de matérias-primas para a Indústria da Borracha, em presença directa ou via representantes, exclusivos ou não. Podia dizer-se que dispúnhamos de um regular e amplo fornecimento, de âmbito praticamente local. Após 1974 e nos conturbados anos que se seguiram, as empresas fabricantes ou os seus representantes foram encerrando progressivamente os seus escritórios e armazéns, transferindo para agentes distribuidores locais a tarefa de comercializar de armazém apenas algumas das matérias-primas – afinal as de utilização mais comum em toda a indústria nacional. E assim se estreitou o leque de opções técnicas na selecção de matérias-primas. E para as matérias-primas menos comuns, o âmbito local foi substituído pelo âmbito ibérico – nuns casos e mesmo pelo âmbito europeu ou internacional em muitos outros, com a aquisição local a ser substituída por importação directa da quantidade mínima exigida. E é esta a realidade actual.
Se o composto a formular for de cor não negra (branco, colorido, translúcido ou transparente), deve existir particular atenção no tipo de borracha mais adequado. Em primeiro lugar, deve ser um tipo de borracha não manchante (por exemplo, seleccionar uma borracha do tipo SBR 1502, SBR 1509 ou SBR-OE 1778 em vez de SBR 1500 ou SBR-OE 1712). Em segundo lugar, se o composto for translúcido ou transparente, o tipo de borracha a seleccionar deve ser também o mais adequado: utilizar um tipo de borracha natural muito claro (por exemplo, RSS1 ou um crepe muito claro) ou um poli-isopreno IR-500 ou IR-305, SBR 1509 ou SBR-OE 1707, por exemplo.
Introdução
Na selecção da matriz elastomérica, o técnico de formulação pode optar pela selecção de dois ou mais tipos de borrachas. Na língua inglesa esta mistura de dois ou mais tipos de borracha é designado por Rubber blend.
Obviamente que esta opção não é tomada por um simples capricho. As misturas de diferentes tipos de borrachas são efectuadas por três razões principais:
Como sabemos, os custos dos diversos tipos de borracha são diferentes. Pode ser necessário, por razões de competitividade, reduzir o custo final do composto. E isso pode ser conseguido pela substituição de uma parte da borracha base, de custo mais elevado, por uma borracha de custo mais baixo. Contudo, a quantidade substituída não deverá originar alterações significativas do valor das diversas propriedades. Um exemplo muito corrente diz respeito a compostos formulados com borracha natural e borracha SBR, em que as proporções em presença destes tipos de borracha podem variar, sem que ocorram alterações sensíveis das suas principais propriedades, em função das oscilações dos seus preços no mercado. Como outros exemplos podemos mencionar a introdução de algumas partes de borracha SBR, de preço inferior, em substituição de borrachas de Policloropreno (CR) ou de Acrilonitrilo Butadieno (NBR), de preços bem superiores.
O tipo de borracha seleccionado pode apresentar, por vezes, algumas dificuldades que ocorrem no seu processamento, mais frequentemente em processos de calandragem, de extrusão ou de moldagem. A combinação de diferentes tipos de borracha ou mesmo de diferentes graus do mesmo tipo de borracha pode introduzir modificações significativas e facilitar o seu processamento. Por exemplo, a introdução de Policloropreno do tipo WB (este tipo de borracha contém uma elevada percentagem de gel polimérico) melhora consideravelmente a qualidade de calandrados (superfícies lisas e excelente regularidade da espessura) e de extrudidos (superfícies lisas, maior resistência ao colapso de secções ocas e menor inchamento à saída da fieira). Comportamento idêntico é observado com a introdução de borrachas parcialmente pré-reticuladas NR (PA-80, por exemplo), e SBR (SBR 1009, por exemplo), em diversos tipos de compostos.
A combinação de dois ou mais diferentes tipos de borracha pode proporcionar a melhoria de uma ou mais propriedades do composto vulcanizado. Como exemplo, pode referir-se que, numa composição à base de borrachas NR ou SBR, a substituição de 5 a 30 partes dessas borrachas, por um adequado tipo de borracha EPDM, permite obter uma melhoria muito significativa da resistência ao envelhecimento por acção da intempérie e do ozono. A melhoria de propriedades proporcionará, seguramente, um melhor desempenho e uma maior durabilidade dos artefactos.
Selecção dos tipos de borracha a misturar
Devem ser tomados especiais cuidados na selecção das borrachas a misturar. O técnico de formulação deve conhecer muito bem todos os tipos de borrachas, nomeadamente quanto a parâmetros de solubilidade, polaridade e grau de insaturação. Quanto maior a similaridade destas características, maior será a compatibilidade entre diferentes tipos de borrachas.
Na Figura 1 são apresentadas as polaridades relativas dos vários tipos de borrachas sintéticas, da borracha natural e do termoplástico cloreto de polivinilo (PVC), utilizado muitas vezes em misturas com borracha NBR.
Figura 1 – Polaridade relativa de diversos tipos de borrachas
No Quadro 6 são apresentados os parâmetros de solubilidade dos vários tipos de borrachas sintéticas, da borracha natural e do termoplástico cloreto de polivinilo (PVC), utilizado muitas vezes em misturas com borracha, sobretudo NBR.
Tal como acontece com as polaridades, quanto mais afastados forem os valores dos parâmetros de solubilidade, menor será a compatibilidade entre diferentes tipos de borrachas. Normalmente é adoptado o critério que a seguir se indica:
É bem conhecida a impossibilidade de obter vulcanizados de borracha natural ou de borracha de estireno butadieno (entre outras), com borracha butílica. A primeiras, com elevado grau de insaturação, não podem ser co-vulcanizadas com borrachas butílicas, que são borrachas com um reduzido grau de insaturação. Também, misturas de borracha EPDM com outros tipos de borrachas com elevado grau de insaturação somente são possíveis com tipos de borracha de EPDM com alto teor em dieno, o que permite uma correcta co-vulcanização. Contudo, a utilização dos chamados agentes de compatibilização tornou possível a mistura dos mais diversos tipos de borracha, como veremos.
Mas existem ainda outros aspectos a considerar. Num composto com dois (ou mais) tipos de borracha e com um determinado sistema de vulcanização, a velocidade de vulcanização das borrachas utilizadas pode ser muito diferente, por motivos relacionados com diferenças de polaridade, diferenças nos graus de insaturação e também diferenças de solubilidade dos agentes e aceleradores de vulcanização. De tudo isto resultará um estado de vulcanização não homogéneo e também um enfraquecimento das propriedades do vulcanizado. Relativamente ao sistema de vulcanização e, como regra geral, pode afirmar-se que a migração de aceleradores é maior para as borrachas mais polares e que a solubilidade dos agentes e aceleradores de vulcanização é maior nas borrachas de maior grau de insaturação.
E pode dizer-se que isto também acontece com todos os ingredientes do composto. Por exemplo, a distribuição da carga e do plastificante nas fases das borrachas em presença pode ser também diferente resultando, deste facto, um vulcanizado com propriedades inferiores. É o que acontece numa mistura de borrachas SBR com BR ou de borrachas SBR com NR e BR; é bem conhecida a diferente distribuição da carga de negro de carbono nas fases de SBR, de NR e de BR. E repare-se que a diferença entre os parâmetros de solubilidade destes três tipos de borracha é muito pequena (considerados os valores médios dos valores indicados no Quadro 6, em MPa(1/2)):
A diferença entre os valores extremos é de apenas 0,40!
Portanto, pode afirmar-se que são muito raros os casos em que existe uma completa miscibilidade das borrachas em presença. Esta miscibilidade é também influenciada:
A adição de um agente dispersante adequado revela-se muito positiva num grande número de casos. Por exemplo, uma resina com base em hidrocarbonetos alifáticos melhora a homogeneidade de misturas de borrachas de diferentes polaridades (ou diferentes parâmetros de solubilidade) e de misturas de borrachas comprovadamente compatíveis, mas com diferentes viscosidades.
Nas últimas décadas têm sido desenvolvidas alguns métodos para melhorar as características técnicas de misturas de borrachas com alguma compatibilidade e também para tornar possível a mistura de borrachas totalmente imiscíveis. Misturas miscíveis ou parcialmente miscíveis são utilizadas com grande frequência. No entanto, nas misturas com borrachas parcialmente miscíveis é normal que o nível de dosagem do segundo tipo de borracha seja limitado a um valor máximo. Também a viscosidade das borrachas em presença determina, de certo modo, a morfologia da mistura; viscosidades muito próximas dão origem a dispersões morfologicamente mais regulares. Contrariamente, grandes diferenças de viscosidade dão origem a morfologias do tipo globular.
Vejamos o que pode ocorrer com as misturas de diferentes tipos de borrachas (Figura 2).
Figura 2 – Mistura de borrachas de diferentes tipos
A mistura de dois tipos de borrachas miscíveis e com viscosidades não muito diferentes proporciona a obtenção de compostos homogéneos, qualquer que seja a percentagem relativa dos dois tipos de borracha.
Da mistura de dois tipos de borrachas compatíveis, mas apenas parcialmente miscíveis, resulta um composto heterogéneo e que se apresenta em duas fases. Nestas condições, será expectável existir uma desigual distribuição dos ingredientes do composto, como já atrás referimos. E, como resultado, teremos um vulcanizado com propriedades inferiores. Veremos adiante que a adição ao composto de um adequado agente dispersante ou, de preferência, de um agente de compatibilização, as propriedades do vulcanizado podem ser apreciavelmente melhoradas.
A mistura de duas borrachas totalmente imiscíveis dá origem a um “composto” constituído por duas fases bem diferenciadas. Existe entre as superfícies das fases em contacto uma elevada tensão e não existe também qualquer adesão entre elas. Como consequência, as propriedades são de um modo geral muito fracas, não existindo, portanto, qualquer interesse técnico e comercial na sua utilização.
Contudo, o desenvolvimento de métodos de compatibilização tornou possível obter compostos com tipos de borrachas imiscíveis, com características técnicas francamente melhoradas, muito aceitáveis e que apresentam, em muitos casos, muito interesse técnico e comercial. A acção destes agentes não confere miscibilidade às borrachas presentes; a sua acção melhora a compatibilidade entre os componentes da mistura. E isto ocorre:
Como resultado, qualquer destas acções potencia uma significativa melhoria das propriedades da mistura.
No exemplo mostrado na Figura 2, a compatibilização entre Cloreto de Polivinilo (PVC) e Etileno, Propileno Dieno Monómero (EPDM) é obtida pela adição de um terceiro tipo de borracha, o Polietileno Clorado (CPE ou CM). O Polietileno Clorado é parcialmente miscível em PVC e em EPDM e assim se estabelece uma ligação entre as duas fases.
No caso já atrás referido de mistura de borrachas SBR, NR e BR, a adição de uma pequena quantidade de borracha natural epoxidada (ENR) (que actua como agente de compatibilização), melhora apreciavelmente as propriedades da mistura vulcanizada, pela promoção de uma maior uniformidade na distribuição dos diversos ingredientes de mistura nas borrachas em presença.
Compatibilização de Misturas de Polímeros
As misturas de polímeros começaram a ser desenvolvidas a partir de 1960 e a sua compatibilização é conhecida há umas cinco décadas, mas desenvolveu-se acentuadamente nas duas últimas décadas, existindo actualmente mais de uma dezena de técnicas possíveis. Estas técnicas de compatibilização de polímeros imiscíveis são sobretudo direcionadas para a mistura de materiais plásticos, modificações de materiais plásticos com elastómeros, no processo de obtenção de elastómeros termoplásticos e no aproveitamento de materiais reciclados (plásticos ou borrachas). Algumas delas são também aplicadas a misturas de borrachas. Misturas de borrachas compatíveis ou parcialmente compatíveis podem também ver algumas das suas propriedades melhoradas pela adição destes agentes de compatibilização, como já referimos.
Os agentes de compatibilização mais correntemente utilizados em misturas de borrachas são:
Existem basicamente três métodos de compatibilização de borrachas imiscíveis:
Vamos apresentar alguns exemplos de compatibilização ou de obtenção de um razoável aumento de homogeneidade:
Misturas de borrachas
Nos Quadros 7, 8 e 9 são apresentadas as misturas mais vulgares, com dois, três ou quatro tipos de borrachas e as suas principais aplicações. Na sua grande maioria, estas misturas não necessitam de agentes de compatibilização.
Nas misturas de borrachas apresentadas nestes quadros, a dosagem do tipo de borracha da coluna A é igual ou superior à dosagem dos tipos de borracha da coluna ou colunas à sua direita.
Significado de algumas das abreviaturas utilizadas:
Actualização em 2021-10-07.