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Na Figura 16 apresentam-se as curvas tensão de tracção–deformação para quatro composições de borracha de diferente dureza:
CURVA A: relativa a uma composição com uma dureza de 35 GIDB, composição do tipo “goma pura” (“pure gum”).
CURVA B: relativa a uma composição com uma dureza de 45 GIDB, também do tipo “goma pura”, porém vulcanizada com um sistema de vulcanização de tipo diferente.
CURVA C: relativa a uma composição com uma dureza de 70 GIDB, composição de alta resistência à abrasão, utilizada em bandas de rodagem de pneus para camião.
CURVA D: relativa a uma composição com uma dureza de 90 GIDB, com elevado nível de cargas, utilizada, por exemplo, em placas para solados.
Pode observar-se que a progressão das diferentes curvas não é linear, isto é, não existe proporcionalidade entre as tensões e as deformações. Isto significa que o módulo – relação entre a tensão e a deformação – é variável com a deformação. Isto equivale também a dizer que, para os materiais elastoméricos, o valor do módulo apenas tem significado desde que seja referido o valor da deformação correspondente, como segue:
M100 – Módulo a 100% de deformação;
M300 – Módulo a 300% de deformação;
M500 – Módulo a 500% de deformação;
e assim sucessivamente, para qualquer valor da deformação.
A ampliação da parte inicial das diferentes curvas (Figura 17) mostra a existência de curtas zonas de linearidade, facto que é geralmente “camuflado” pela pequena sensibilidade da escala de alongamentos. Verifica-se que a primeira parte das curvas apresenta a concavidade voltada para o eixo das deformações; aparece, depois, uma zona de linearidade, no termo da qual a linha apresenta uma inflexão e passa então a apresentar a concavidade voltada para o eixo das tensões.
O módulo de Young representa, para a generalidade dos materiais, o cociente entre a tensão e a deformação, na região de proporcionalidade (ou região de linearidade), da curva tensão-deformação. Na borracha, o módulo de Young representa o declive da corda que une a origem com um ponto da curva tensão-deformação, geralmente na zona das pequenas deformações (como já se referiu, deformações da ordem de 10 a 20%.) Para grandes deformações, o módulo de Young não pode ser utilizado para efeitos de cálculo, devendo ser substituído pelo valor do módulo de tracção, sempre referido ao ponto da curva em que é considerado.
A dureza, os módulos de tracção, o alongamento e a tensão de rotura são as características das borrachas que os técnicos mais utilizam para caracterizar os compostos. Com efeito, estas propriedades são correntemente utilizadas no controlo da produção e também como critérios de qualidade – medidas da resistência da borracha à degradação pelo oxigénio, pelo ozono, pelos agentes atmosféricos e pelo contacto com as mais variadas substâncias químicas. Não menos importante é, como antes foi referido, a variação dessas propriedades, quando analisadas em provetes novos e em provetes envelhecidos, em condições previamente definidas.
A tensão de rotura foi também utilizada como medida da qualidade das borrachas. Na realidade, até praticamente à década de 50, predominavam as composições com base em borracha natural e uma elevada tensão de rotura, como medida “indirecta” da riqueza do composto em material elastomérico, era um significado de “alta qualidade”. Sabemos que, para muitas aplicações, a tensão de rotura pode não ser de todo importante; todavia, uma baixa tensão de rotura pode significar, muitas vezes, propriedades fracas, tais como a resistência à abrasão, a resistência à fadiga por flexões repetidas, uma baixa resiliência, elevadas deformações permanentes, etc..
Muitos artefactos em borracha desempenham a sua função em tensão, como é o caso de tubos, mangueiras, correias transportadoras, câmaras de ar, suportes, etc.. Todavia, num grande número de aplicações, a tensão de serviço não é superior a 1,0-1,5 MPa, pelo que a tensão de rotura tem, de facto, uma importância secundária no bom desempenho do artefacto.
Nalgumas aplicações, as tensões de serviço são bem superiores aos valores atrás indicados; podem ser solicitações de duração mais ou menos prolongada, porém devem permanecer bem distantes dos valores da tensão de rotura. São condições de serviço que o projectista deve evitar, substituindo, sempre que possível, por um outro tipo de solicitações. Com efeito, as possibilidades de falha por rotura ou mesmo por rasgo podem criar problemas muito complicados e de consequências graves.
Quando as curvas de tensão–deformação são obtidas em acção de compressão, para os tipos de borrachas atrás referidos (Figura 16), com exclusão do composto de 45 GIDB, para uma maior clareza da representação – veja-se a Figura 18 – teremos então as curvas representadas no terceiro quadrante do sistema de eixos coordenados.
Podemos observar que as curvas em tracção e em compressão são contínuas na origem. As curvas em compressão não exibem, todavia, a mesma forma das curvas em tracção. Não apresentam inflexão e apresentam a concavidade sempre voltada para o eixo das tensões. O valor máximo da deformação por compressão é, teoricamente, de 100%, razão pela qual todas as curvas são assintóticas para este valor da deformação. O valor do módulo de Young obtido em compressão, também na zona das pequenas deformações, é idêntico ao valor que se obtém em tracção. Para valores mais elevados de deformação, a relação entre as tensões e as deformações em compressão é bem mais complicada, pois que nela também intervém a forma geométrica do espécimen em compressão.
A forma geométrica intervém nas relações tensão-deformação através de um factor conhecido vulgarmente por FACTOR DE FORMA. Este não é mais do que a relação entre a superfície que sofre a carga compressiva e a superfície livre; é, vulgarmente, representado por S:
Para uma forma de paralelepípedo, de secção rectangular de lados L1 e L2 e altura H, quando comprimida na face de lados L1 e L2, (veja-se Figura19 – “A”), teremos:
Para uma forma de paralelepípedo de secção quadrada, de lado L e altura H, quando comprimida na sua face quadrada (Figura 19 – “B”), teremos:
Para uma forma cilíndrica, com o diâmetro D e altura H, quando comprimida na sua face circular, (Figura 19 – “C”), teremos:
Vamos agora verificar qual o efeito do factor de forma na relação entre a tensão e a deformação. Vamos considerar duas formas de paralelepípedo, de secção quadrada, de lado L e com as alturas H1 e H2, sendo H1 > H2. Vamos admitir que os dois blocos são fabricados com a mesma qualidade de borracha e que os lados da secção quadrada, de área L x L estão firmemente ligadas a duas superfícies rígidas e que numa destas é aplicada uma força compressiva F (veja-se Figura 20). A tensão de compressão é igual nos dois casos:
Verifica-se na prática, que o bloco de altura H1 apresenta uma deformação (ou deflexão) x1 que é superior à que se observa no bloco de altura H2, x2:
x1 > x2
o que se deve ao facto do bloco de altura H2 possuir um factor de forma S2, maior que o factor de forma S1, correspondente ao bloco de altura H1:
Visto que: H1 > H2
Esto significa que o bloco de altura H2, por possuir uma área lateral inferior à do bloco de altura H1, tem uma menor possibilidade de expandir-se lateralmente, deformando-se menos, para uma mesma tensão de compressão. Na prática isto corresponde também a dizer que o bloque de altura H2 possui uma RIGIDEZ maior do que o bloco de altura H1 ou, o que é equivalente, que o módulo à compressão do bloque de altura H2 é maior do que o módulo à compressão do bloco de altura H1.
O técnico projectista tem assim de considerar, não somente a rigidez intrínseca da borracha, como também com os contributos de rigidez introduzidos pelo factor de forma e ainda pela existência de eventuais restrições à livre expansão dos planos normais à direcção da força de compressão.
Como o módulo à compressão depende do factor de forma, o módulo de Young deve ser, para efeitos de cálculo, devidamente corrigido. Pode demonstrar-se que:
sendo:
Ec = módulo à compressão, nas condições determinadas pelo factor de forma S;
Eo = módulo de Young característico da borracha utilizada;
k = é um factor numérico;
S = factor de forma.
P. B. LINDLEY, da organização MRPRA, realizou diversas experiências com vulcanizados à base de borracha natural, com dureza compreendida entre 30 e 75 GIDB, para os quais determinou os valores de Eo, de G (símbolo utilizado para o módulo de corte, como veremos adiante), e dos factores numéricos k. A Tabela 19 contém os valores determinados por Lindley, de Eo, G, k e E∞, para borrachas com dureza compreendida entre 30 e 75 GIDB.
Dureza GIDB | Módulo de Young Eo, MPa | Módulo ao corte G, MPa | k | Módulo de compressão E∞, MPa |
---|---|---|---|---|
30 | 0,92 | 0,30 | 0,93 | 1000 |
35 | 1,18 | 0,37 | 0,89 | 1000 |
40 | 1,50 | 0,45 | 0,85 | 1000 |
45 | 1,80 | 0,54 | 0,80 | 1000 |
50 | 2,20 | 0,64 | 0,73 | 1030 |
55 | 3,25 | 0,81 | 0,64 | 1090 |
60 | 4,45 | 1,06 | 0,57 | 1150 |
65 | 5,85 | 1,37 | 0,54 | 1210 |
70 | 7.35 | 1,73 | 0,53 | 1270 |
75 | 9,40 | 2,22 | 0,52 | 1330 |
A determinação de Ec para vários valores de Eo, para borrachas de várias durezas, e para vários factores de forma, possibilita o traçado do ábaco conhecido como das “Curvas em S“, ilustrado na Figura 21.
No ábaco temos:
Dissemos que os lados do bloco de borracha submetidos às acções compressivas estão firmemente ligados a superfícies rígidas; é que as experiências e determinações efectuadas por Lindley foram conduzidas nestas condições. O tipo de interacção das superfícies em contacto, intervém também na relação entre as tensões e as deformações. Isto é apresentado na Figura 22, onde relações tensão-deformação foram determinadas para várias situações:
Com a borracha apoiada em superfícies lubrificadas.
O estado das superfícies em contacto cria uma maior ou menor restrição à livre deformação da borracha; quanto mais abrasiva for a superfície, maior é o grau de restrição. As superfícies de borracha, quando ligadas a metal impõem, obviamente, o maior grau de restrição.
O projectista nem sempre concebe produtos constituídos por formas geométricas simples, em que o factor de forma é perfeitamente definido. Assim, pode ter necessidade de estimar um valor para o factor de forma para mais do que uma forma simples ou para formas de geometria supostamente equivalentes.
Por razões de estabilidade, um artefacto de borracha não deve ser mais espesso que a sua dimensão mínima em largura. Em situações em que a tensão de compressão é baixa (por exemplo, da ordem de 0,1 – 0,2 MPa), uma relação Lmín/H = 2 pode ser satisfatória. Em situações de compressão elevada, deve considerar-se, como mínimo, L/H = 5.
Os artefactos em borracha devem possuir, sempre que possível, simetria geométrica, de forma a observar-se uma regular distribuição de tensões. O factor de forma deve ser baixo sem, contudo, se avizinhar de situações de compressão hidrostática (bulk compression). Recomenda-se a utilização de factores de forma compreendidos entre 0,3 e 1,5. As deformações por compressão não devem exceder os 15% e devem ser mantidas, de preferência, abaixo dos 10%; as tensões de compressão não devem exceder 5,5 MPa.
Um outro tipo de solicitações, por ventura dos mais utilizados em Engenharia (por exemplo, em apoios e suspensões) é o que resulta de tensões tangenciais, também vulgarmente designadas como tensões de corte. Na Figura 23 representa-se, de forma esquemática, uma deformação em corte. Verifica-se neste tipo de solicitação que, para uma mesma acção deformadora, o valor da deformação é superior ao que se verifica em compressão.
A caracterização da deformação por corte pode fazer-se pelo cociente entre a deformação X e a espessura t, ou ainda pelo ângulo θ, expresso em graus ou em radianos.
Repare-se que:
O factor de proporcionalidade entre as tensões e as deformações é o módulo ao corte G, a que já nos referimos algumas vezes:
A relação entre tensões e deformações é praticamente independente do factor de forma, o que facilita, de certo modo, o estabelecimento das relações matemáticas nas fases de projecto. Para efeitos de projecto, não devem ser consideradas deformações superiores a 5O%, isto é:
x / t < 0,5
e as tensões de corte não devem ser superiores a 0,4 MPa.
Este tipo de solicitações pode ser considerado, de certo modo, como uma forma de solicitação tipo corte, visto que resulta, também, de tensões do tipo tangencial. Consideremos a mola de torção representada na Figura 25. A rigidez desta mola é:
θ é a deformação angular provocada pelo momento de torção M. Também a relação entre os momentos de torção e a deformação angular é linear, portanto proporcional, e é também independente do factor de forma.